A discussão sobre a implantação de um ramal ferroviário interno no futuro Tecon Santos 10, no Porto de Santos, reacende um debate crucial: até que ponto a obrigatoriedade dessa integração contribui para a eficiência logística do terminal e para a competitividade do porto?
Atualmente, o contrato em análise pelo Tribunal de Contas da União (TCU) prevê a construção do ramal até o oitavo ano de arrendamento ou, em caso de não execução, o pagamento de outorga adicional de R$ 24,5 milhões à Autoridade Portuária.
Embora a medida pareça equilibrada em termos contratuais, a avaliação técnica e mercadológica revela nuances importantes.
Baixa participação dos contêineres na ferrovia
Os números mais recentes demonstram que a movimentação ferroviária de contêineres no Porto de Santos permanece marginal. Em 2023, foram cerca de 1,8 milhão de toneladas transportadas por trem, contra 36,6 milhões de toneladas movimentadas no total, participação inferior a 5%. Em 2024, a proporção se manteve no mesmo patamar.
O contraste é ainda mais evidente quando comparado ao perfil das cargas ferroviárias: das 60 milhões de toneladas que chegaram a Santos pela ferrovia, apenas 2% eram contêineres. A predominância histórica do modal sobre granéis sólidos e líquidos explica a baixa atratividade para os terminais de contêineres.
Além disso, a diferença entre os tipos de vagões utilizados limita a flexibilidade operacional.
A percepção do mercado: o caso BTP
O exemplo da Brasil Terminal Portuário (BTP) reforça esse cenário. Em sua proposta de renovação contratual, a empresa apresentou um amplo plano de investimentos em capacidade operacional e eficiência, mas optou por não implantar ramal ferroviário interno, apesar da linha férrea estar praticamente à sua porta.
A decisão, baseada em estudos técnicos e estratégicos, considerou fatores como: baixa participação da ferrovia na movimentação de contêineres; prioridade para uso do espaço em pátio, essencial às operações; e complexidade logística da integração ferroviária.
O caso demonstra que, mesmo em grandes terminais, a ferrovia não é necessariamente prioridade estratégica para contêineres.
Riscos de distorções no TECON Santos 10
Outro ponto de atenção é a possibilidade de o Tecon Santos 10 receber linhas férreas em número desproporcional à sua demanda real. Isso poderia transformar o terminal em solução para gargalos estruturais da malha ferroviária da margem direita, voltada principalmente para granéis, em vez de atender às necessidades específicas de contêineres.
Além disso, projetos viários na região, se mal posicionados, podem comprometer a fluidez do acesso rodoviário, fundamental para o escoamento da carga. Estudos técnicos recomendam soluções integradas, que preservem a área destinada a gates e evitem congestionamentos urbanos.
Impactos na capacidade do terminal
Implantar um ramal ferroviário interno significa ocupar parte do pátio, ativo mais valioso de um terminal de contêineres. Essa perda reduz a capacidade estática de armazenamento e compromete o ciclo operacional entre navio, pátio e gate.
Barreiras físicas no layout, como linhas férreas, alongam o tempo de movimentação dos equipamentos, reduzem a produtividade e impõem custos adicionais. Na prática, o terminal pode perder milhões de TEUs/ano de capacidade dinâmica.
Flexibilidade como caminho
Diante desse cenário, a imposição contratual de construção do ramal ferroviário cria um risco de “perde-perde”: o operador seria obrigado a investir em uma estrutura de baixo retorno, sacrificando área nobre de operação, enquanto o Porto perderia competitividade.
O mais adequado é que a decisão permaneça nas mãos do futuro arrendatário, com base em seu modelo de negócios, perfil de clientes e projeções de mercado. Para alguns operadores, a integração ferroviária pode ser viável e estratégica. Para outros, pode significar perda de eficiência e produtividade.
A flexibilidade é, portanto, essencial. Ao permitir que o arrendatário escolha a solução mais adequada, garante-se que o TECON Santos 10 preserve sua competitividade e que investimentos sejam feitos de forma racional, alinhados às demandas reais da logística portuária.
Ivam Jardim Arienti é consultor portuário e sócio-diretor da Agência Porto Consultoria
Publicações
Ramal ferroviário no TECON Santos 10: eficiência logística depende de decisão estratégica
Como podemos ajudar?
Conte como podemos auxiliar com um dos nossos serviços e soluções.
Solicite um orçamento