O Decreto dos Portos completa hoje um ano sem que tenha produzido avanços e no centro de uma polêmica palaciana. A norma foi publicada com a promessa de flexibilizar regras consideradas travadas demais pela Lei dos Portos, de 2013, da ex-presidente Dilma Rousseff, e deflagrar investimentos de R$ 25 bilhões na modernização de terminais e novas instalações. Mas não andou sobretudo por duas razões.
O decreto nº 9.048, de 10 de maio de 2017, é alvo de um inquérito que envolve o presidente Michel Temer sobre suposto recebimento de propina para beneficiar a empresa Rodrimar e está "travado" no Tribunal de Contas da União (TCU). A área técnica da corte levantou questionamentos sobre a legalidade e constitucionalidade da norma. Entre eles, a possibilidade de extensão do prazo de contratos de exploração de áreas em portos públicos por mais tempo do que o previsto no edital: até o limite de 70 anos, via prorrogações sucessivas.
As outras duas questões são a realização de investimentos fora da área do terminal e a substituição da área arrendada por outra dentro do porto público. "São questões dogmáticas. Não há decisão do pleno, não há voto do relator, é um auditor interno levantando três questões", diz o presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), José Di Bella Filho.
Como resultado, nenhum dos mais de cem pedidos de adaptação ao decreto de contratos vigentes foi assinado. Para Di Bella, a norma tinha como principal regra desburocratizar o segmento. "Não é aceitável uma empresa passar cinco anos para conseguir aprovação para realizar investimentos que vão aumentar a capacidade para atender demanda", afirma.
O presidente da Associação de Terminais Portuários Privados (ATP), Murillo Barbosa, diz que a liberdade de investir foi afetada pelo que chama de insegurança jurídica. "Estamos há um ano sem mudanças efetivas. O decreto foi feito para flexibilizar e modernizar o setor. Mas, ao contrário, estamos em descompasso em relação às aspirações geradas pela nova regulação."
Apesar de os questionamentos do TCU não se referirem aos terminais de uso privado (representados pela ATP), as instalações desse tipo que querem adaptar os contratos à norma também não conseguiram êxito. O Ministério dos Transportes firmou um compromisso com o TCU de não assinar adaptações até que houvesse uma posição da Corte. "Sofremos a mesma restrição", disse Barbosa.
Em nota, o ministério disse que sem o posicionamento final do TCU decidiu pelo não prosseguimento das adaptações contratuais, "o que por óbvio impossibilita que os interessados apresentem seus novos planos de investimentos para avaliação". Dessa forma, continuou, "de fato, não usufruímos dos resultados do decreto, até o presente momento."
A pasta informou ainda que está prestando subsídios ao TCU para que, com os elementos que embasaram o grupo técnico que discutiu a proposta de decreto por mais de seis meses, haja "condições de entender a lógica e motivação adotadas pelo governo e que certamente culminarão com investimentos imediatos e expressivos no setor portuário nacional."
Fonte: Valor, 10/05/2018.